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O PLÁGIO É APENAS UM DETALHE


Iraci del Nero da Costa
São Paulo, 22 de novembro de 2009



De há muito a asquerosa prática de usurpar o esforço despendido por orientandos universalizou-se em nosso meio universitário. Assim, é comum ver-se artigos encimados pelos nomes dos elaboradores efetivos de tais estudos – que se viram consubstanciados em dissertações de mestrado ou teses de doutorado – acompanhados pelos de seus orientadores os quais, em muitos casos, mais grotescos ainda, veem-se seguidos pelos nomes de muitos outros coautores.

Esta é a regra, dizem os mestres e doutores que acabaram de defender seus trabalhos, vilmente apropriados por seus mestres, os quais deveriam tomar como primeiro mandamento o respeito pelo empenho de seus alunos e a proteção de seus achados.

Vergados a uma burocracia absolutamente apartada do verdadeiro espírito universitário e de qualquer compromisso com o alargamento e universalização do "saber pelo saber", tais pessoas, interessadas apenas em "construir" currículos formais com numerosos tópicos, não raro se unem em estudos com um alentado número de autores cujo contributo para a elaboração dos trabalhos em questão foi absolutamente nulo, todos a servirem-se da diligência de terceiros.

Cheguei a encontrar, na desprezível Plataforma Lattes, casos em que apenas o mestrado e/ou o doutorado eram atribuídos exclusivamente ao autor pesquisado, pois em todos os demais trabalhos arrolados no "documento" fazia-se presente um abundante número de coautores. Como se deve concluir, o trabalho em equipe é mais uma das conquistas de nosso mundo acadêmico.

Paralelamente, outra conclusão a se impor é a de que os solitários e ensimesmados Meneghettis são próprios de um passado definitivamente superado, pois nos dias correntes nos defrontamos com o flamante e superior crime organizado.



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BRASIL: BREVES COMENTÁRIOS SOBRE ALGUMAS SÉRIES REFERENTES À TAXA DE CÂMBIO


Nelson Nozoe
Agnaldo Valentin
José Flávio Motta
Maria Lucília Viveiros Araújo
Iraci del Nero da Costa
Francisco Vidal Luna
São Paulo, janeiro de 2004



Nesta nota, além de indicarmos algumas das séries concernentes à taxa de câmbio que vigorou no Brasil no correr dos séculos XIX e XX, procuramos qualificá-las de sorte a identificar quais delas nos parecem, em termos genéricos, as mais confiáveis. Tal confiabilidade prende-se, estritamente, à mera comparação entre as séries disponíveis, pois não as submetemos a nenhum tipo de teste que fosse além do simples confronto.

Série A. A tabela intitulada "Curso do câmbio na praça do Rio de Janeiro -- 1822/1939" consta das Séries Estatísticas Retrospectivas (1), publicação de 1986, vol. 1, p. 63-64; trata-se da edição fac-similar da Separata do Anuário Estatístico do Brasil - 1939-1940. Indica-se como fonte dos dados o Anuário Estatístico do Brasil, anos III e IV, "Estatísticas Econômicas", n. 10 E.E.S. do Serviço de Estatística Econômica e Financeira. Efetuamos, para o período 1822-1843, a comparação desta Série A com a Série C, as conclusões foram as seguintes: a) a discrepância revelou-se muito pequena; para o período acima apontado a diferença foi de 0,08846% (a taxa implícita, que compõe a Série C, mostrou valores ligeiramente maiores); b) em suma, é indiferente o uso da Série A ou da Série C. Não obstante, a Série C, por contemplar um período de tempo mais largo, merece nossa preferência.

Série B. Também existe a série apresentada por Helio Schlittler Silva no artigo "Tendências e características do comércio exterior do Brasil no século XIX", publicado na Revista de História da Economia Brasileira (ano I, n. 1, junho de 1953, São Paulo, Fiesp, p. 5-21), da qual o IPE-USP publicou edição fac-similar. A série cobre o período 1821-1900 e é anotada como "A taxa do câmbio no século XIX (Cr$ p. £)". A fonte indicada pelo autor é o Anuário Estatístico do Brasil, 1o. ano (1908-1912), vol. II, p. 243. Schlittler transformou (com alguns erros de arredondamento) os dados em mil-réis do anuário de 1908-1912. O Anuário Estatístico do Brasil - 1939-1940 estampou parte destes dados – o câmbio médio –, mantendo os dados em mil-réis. Schlittler fornece as taxas (Cr$ por £) segundo seu valor médio, máximo e mínimo, todos em termos de cruzeiros de 1912. Enfim, esta Série B corresponde, de fato, à Série A indicada acima; impõe-se, assim, a recomendada Série C.

Série C. No terceiro volume das Séries Estatísticas Retrospectivas (2), consta, nas páginas 568-571, a taxa de câmbio implícita – definida como o valor do comércio exterior (exportação + importação) em moeda nacional dividido pelo seu valor em moeda estrangeira (libras até 1939 e dólares de 1940 em diante) – para os períodos 1821-1900 (tabela 11.1) e 1901-1987 (tabela 11.2). Os dados relativos à taxa de câmbio são apresentados, até 1939, em termos de mil-réis por libra; em 1940 e 1941, em mil-réis por dólar; de 1942 até 1966, em cruzeiros por dólar; de 1967 a 1969, em cruzeiros "novos" por dólar; de 1970 em diante, em cruzeiros por dólar. Esta é, para o período que cobre, uma das melhores séries por nós compulsadas.

Série D. Para o período 1870-1930 tem-se a série mensal da cotação da libra esterlina em relação à moeda nacional (pence por mil-réis), estampada pelo IBGE no terceiro volume das Séries Estatísticas Retrospectivas (2), páginas 591-596. Possivelmente há séries mensais para outros períodos; não obstante, como nosso interesse imediato não se prendeu a esse tipo de informação, não a procuramos sistematicamente.

Série E. No tomo 1 do volume 2 das Séries Estatísticas Retrospectivas (3) apresenta-se, na página 344 de sua primeira parte, uma série para o "Curso de câmbio sobre Londres, de 1808 a 1906" com dados para a taxa média, mínima e máxima. Neste tomo 1 do volume 2, como se trata de uma edição fac-similar, há duas numerações correspondentes às duas partes que o compõe: a primeira ('Introdução') é numerada até a página 353. Segue uma segunda parte, sobre "Indústria extrativa – reino vegetal", com nova numeração que termina na página 552. Todo esse material foi publicado, originalmente, em 1907. A série em questão encontra-se na primeira parte. Integra o tópico intitulado FINANÇAS, de autoria de Vieira Souto. De fato, traz a série de 1808 a 1906, agrupada em 3 sub-séries, conforme a paridade (1808-1833, quando o par era de 67 1/2; 1834-46, ao par de 43 1/5 e, por fim, de 1847 em diante, ao par de 27 d. por 1$000). A fonte das informações não é indicada. Os dados são apresentados em termos de pence por mil-réis. Esta é uma das séries por nós recomendada.

Série F. No Anuário Estatístico do Brasil, 1o. ano (1908-1912), vol. II, Rio de Janeiro, 1917, encontra-se, na página 243 e sob o título "Movimento cambial", a tabela "II - Cotações do câmbio sobre Londres (1812-1912)", cujos dados vêm em termos de pence por mil-réis. Quase todos esses valores coincidem com os estampados na Série E e, embora só tenham início em 1812, estendem-se até 1912. Recomenda-se, assim, que se tomem os valores referentes ao período 1808-1811 da Série E e, os concernentes ao período 1812-1912, desta Série F ou, alternativamente, os que compõem a Série M, os quais coincidem com os desta Série F e abrangem, como será visto adiante, o período 1812-1930; de toda sorte, para o lapso 1913-1930, tem-se de considerar as informações contidas na Série M.

Série G. Contamos, também, com a série reproduzida por Katia M. de Queirós Mattoso – Cf. Ser Escravo no Brasil. São Paulo, Brasiliense, 1982, p. 254 – cuja fonte é Westphalen, Bach & Krohn. Centenário 1828-1928. Bahia, 1928, p. 87. Embora os valores arrolados por Westphalen et alii estejam muito próximos dos constantes das Séries E e F, deve-se dar preferência a essas últimas, pois, não só abrangem um período mais extenso (1808-1912 versus 1808-1889), mas também trazem mais informações uma vez que nelas são consignadas, além das cotações médias – às quais se restringe esta Série G –, as cotações mínimas e máximas.

Série H. Temos, ainda, a série apresentada por João Pandiá Calógeras na obra A política monetária do Brasil. São Paulo, Cia. Ed. Nacional, 1960. A série cobre o período 1808-1909. Trata-se de uma série dispensável, pois as discrepâncias com respeito aos dados das Séries E e F são de pequena monta. Roberto C. Simonsen, na página 408 de sua História Econômica do Brasil (1500-1820). São Paulo, Ed. Nacional, 8a. ed., 1978, (Coleção Brasiliana, série Grande Formato, vol. 10), reproduz parte dos dados reportados por João Pandiá Calógeras.

Série I. Há a série elaborada por (Luis) Pinto Ferreira em Capitais estrangeiros e dívida externa do Brasil. São Paulo, Brasiliense, 1965, p. 88. Pinto Ferreira serviu-se dos valores publicados na Série E para calcular, de 1810-19 a 1930-39, as médias decenais do câmbio (em pence por mil-réis ou cruzeiro); em face disso podemos dispensar seus números.

Série J. Os valores reportados por Liberato de Castro Carreira – Cf. História financeira e orçamentária do Império do Brasil. Brasília, Senado Federal/Rio de Janeiro, Fundação Casa de Rui Barbosa, 1980, p. 742-743 – podem ser deixados de lado, pois, além de pouco discreparem dos valores das Séries E e F, cobrem, apenas, o período 1822-1888.

Série K. Os valores anotados por Mircea Buescu cobrem o período 1826-1900. Em seu livro 300 anos de inflação. Rio de Janeiro, APEC Editora, 1973, apresenta quatro quadros (p. 153, p. 179, p. 198 e p. 218) com a taxa de câmbio (mil-réis por £) para o lapso temporal 1826-1886/87. O mesmo autor, na página 263 de História econômica do Brasil: pesquisas e análises, Rio de Janeiro, APEC Editora, 1970, já apresentara, para o período 1850-1886, os mesmos dados de sua obra referida acima, acrescentando, ademais, informações para os anos que se estendem até 1900; além disso, no trabalho de 1970, a taxa de câmbio vem anotada em mil-réis por £ e em pence por mil-réis. Todos esses números, não obstante, são redundantes, pois reproduzem as informações das Séries E e F.

Série L. Outra série a ser dispensada é a publicada por Alfredo Ellis Júnior em A economia paulista no século XVIII: o ciclo do muar, o ciclo do açúcar. São Paulo, Academia Paulista de Letras, 1979, (Bibl. Academia Paulista de Letras, vol. 11). Nas páginas 73 a 75 dessa obra encontra-se o "Quadro das flutuações cambiais brasileiras sobre Londres, de 1812 a 1872", elaborado em duas colunas: na primeira indica-se o "câmbio médio" em dinheiros ou pence por mil-réis, já na segunda vem ele expresso em termos de mil-réis por libra esterlina. Os valores e cálculos desta Série L reportam-se, até 1834, aos números que constam das Séries E e F; já para o restante do período, os quantitativos pouco divergem dos inscritos nestas duas últimas séries.

Série M. Nas páginas 253-255 de seu livro Evolução econômica do Brasil, J. F. Normano (4) publicou a tabela denominada "Taxa de câmbio no Rio de Janeiro sobre Londres". Os dados, concernentes às cotações mínima, máxima e média, são expressos em pence por mil-réis e cobrem o período 1812-1930. Tais informações, embora coincidam com as estampadas na Série F, estendem-se, como avançado, por um lapso temporal um pouco maior: vão elas de 1812 até 1930, enquanto as da Série F, como visto, restringem-se ao período 1812-1912. Como afirmado acima, fica marcada, pois, nossa recomendação desta Série M.

Série N. Oliver Onody, na obra A inflação brasileira (1820-1958), Rio de Janeiro, 1960, estampa, nas páginas 22-24, a tabela intitulada "Brasil – taxa do câmbio da libra esterlina (livre)". Segundo o autor, é apresentado, para o período 1822-1956, o "câmbio médio" em "(Cr$ p. £)". Seus valores praticamente coincidem com os da Série C à qual deve-se dar preferência, pois sua cobertura, bem mais ampla, vai de 1821 a 1987.

Série O. No CD-ROM que acompanha o volume Estatísticas do século XX (5), preparado pelo Centro de Documentação e Disseminação de Informações do IBGE, estão presentes duas tabelas confiáveis: "10 - Taxa de câmbio moeda nacional/US$: 1889-1946" e "11 - Taxas de câmbio comercial R$/US$: 1947-2000".

Série P. Tenha-se presente, ainda, que Carlos Inglez de Souza – em seu livro intitulado A anarchia monetária e suas conseqüências. São Paulo, Monteiro Lobato & Cia. Editores, 1924 – divulga valores da taxa de câmbio, em pence por mil-réis, encontráveis nas séries publicadas pelo IBGE. Procedimento similar encontramos em trabalho de João Carneiro da Fontoura denominado Documentação para o Histórico das Tarifas Aduaneiras no Brasil, Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Tomo Especial: Congresso Internacional de História da América (1922), vol. VII. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1928.

Série Q. Amaro Cavalcanti – Cf. O meio circulante nacional: resenha e compilação chronoligica de legislação e factos. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1893, v.1, p. 315-321 – divulgou séries publicadas em diferentes obras e fontes: SAY, Horace Émile. Histoire des relations commerciales entre la France et le Brésil et considérations générales sur les mannaies, les changes, les banques et le commerce extérieur, Paris, Guillaumin, 1839 (dados da tabela I, abaixo referida); MINISTÉRIO DA FAZENDA. Mapa anexo ao Relatório sobre melhoramentos do meio circulante. Rio de Janeiro, Typ. Nacional, 1833; STURZ, J. Notes on Brazil, Londres, 1837, p. 115; ARMITAGE, J. The history of Brazil, London, 1836, 2º vol., p. 147; RELATÓRIO da Comissão de Inquérito de 1859 (anexo B); CAVALCANTI, A. Resenha financeira do ex-Império. Rio de Janeiro, 1890 (dados das tabelas II e IV, referidas a seguir). Em sua tabela II aponta, somente, os valores extremos entre 1808 e 1835, tais dados são os mesmos que os reportados por João Pandiá Calógeras (Cf. Série H deste artigo). Sua tabela I difere da II, pois indica – para o mesmo intervalo de tempo – valores para alguns meses de cada ano; não obstante, as taxas mais altas e mais baixas não coincidem com as inscritas na tabela II: por exemplo, na tabela II lê-se que o câmbio oscilou, em dado ano, entre 44,5 e 28,75, já na tabela I consta o valor de 46 para o mês de setembro do mesmo ano. De outra parte, cumpre observar que os valores informados para os meses colocam-se, todos, dentro das faixas limitadas por pontos extremos que constam do título "Curso de câmbio sobre Londres, de 1808 a 1906" referido na Série E deste artigo. Já em sua tabela IV, A. Cavalcanti anota valores para o câmbio médio que, embora não sejam coincidentes, mostram-se muito próximos dos concernentes à taxa média arrolada na aludida Série E deste nosso artigo e, como dito acima, referentes a Londres. Em síntese, ainda que os dados mensais possam sugerir uma precisão maior para as conversões, o fato de serem anotadas para um curto período nos leva a acreditar que as séries recomendadas no fecho destes comentários são mais úteis do que as recolhidas por Amaro Cavalcanti.

Série R. Nas páginas 145 e 146 da publicação do IBGE intitulada O Brasil em números (Apêndice do "Anuário Estatístico do Brasil – 1960"). Rio de Janeiro, IBGE, 1960, vem anotado, na tabela XCVII (Dívida Pública Nacional, 2. Externa – 1824/959), o valor médio da Libra (em Cr$) para o período 1824-1959. Esta série, cuja utilização deve ser descartada, pouco diverge das Séries A e C apresentando, para avultado número de anos, os mesmos valores constantes nestas duas últimas.


CONCLUSÃO. Em face do exposto parece-nos aconselhável, pois, a utilização das seguintes Séries: C (moeda brasileira por moeda estrangeira, veja relações discriminadas acima, 1821-1987); E (1808-1906, pence por mil-réis), F (1812-1912, pence por mil-réis); M (1812-1930, pence por mil-réis) e O (1889-2000, moeda nacional por US$). Para uma crítica dos dados aqui recomendados considere-se, além da apresentação publicada no vol. 3 das Séries Estatísticas Retrospectivas (páginas 559-567), a bibliografia nela referida.



NOTAS

(1) Repertório estatístico do Brasil: quadros retrospectivos (Separata do Anuário Estatístico do Brasil, Ano V, 1939/1940). Rio de Janeiro, IBGE/CNI, edição fac-similar, 1986, (Séries estatísticas retrospectivas, vol. 1).

(2) Estatísticas históricas do Brasil : séries econômicas, demográficas e sociais de 1550 a 1988, 2a. edição revista e atualizada, Rio de Janeiro, IBGE, 1990, (Séries estatísticas retrospectivas, vol. 3).

(3) O Brasil, suas riquezas naturais, suas indústrias / Centro Industrial do Brasil: Tomo I. Introdução, Indústria Extrativa. [editado originalmente em 1907]. Rio de Janeiro, IBGE/CNI, edição fac-similar, vol. 2, tomo 1, 1986, (Séries estatísticas retrospectivas, vol. 2, tomo 1).

(4) NORMANO, J. F. Evolução econômica do Brasil. São Paulo, Cia. Ed. Nacional, 2a. ed., 1945, (Brasiliana, vol. 152).

(5) IBGE. Estatísticas do século XX / IBGE, Centro de Documentação e Disseminação de Informações. Rio de Janeiro, IBGE, 2003, 543 p., il. Acompanha um CD-ROM.



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